quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A revelação da sabedoria de Deus

No dia 19 de Janeiro, alguns elementos do grupo de reflexão FRA reuniram-se no Instituto Justiça e Paz para reflectir sobre o primeiro capítulo da encíclica Fides et Ratio, intitulado A Revelação da Sabedoria de Deus. A reflexão sobre este capítulo da encíclica foi orientada pelo padre Nuno, e depois seguiu-se um momento de diálogo entre os presentes.
O padre Nuno, depois de uma leitura cuidada de algumas partes do primeiro capítulo da Fides et Ratio, prosseguiu a sua prelecção, aludindo ao contributo doutrinário da Constituição dogmática Dei Filius, do Vaticano I, e da Constituição dogmática Dei Verbum, do Vaticano II. Tanto numa como noutra afirma-se a possibilidade do conhecimento de Deus, que Se revelou na História da salvação, pela via da fé e da razão.
No primeiro ponto, denominado Jesus, revelador do Pai, deixa-se patente que a Igreja tem a consciência de ser depositária duma mensagem, cuja origem está em Deus. Nesta ordem de ideias, segundo o orador, a medida não é o homem ou a nossa capacidade, mas Deus. Importa ainda realçar que a Igreja, enquanto sacramento universal de Salvação, é o instrumento ao serviço dessa mensagem divina. Por outro lado, numa atitude gratuita, Deus revelou-Se a Si mesmo e deu a conhecer o mistério da Sua vontade. Deste modo, através de Jesus, revelador do Pai e Verbo encarnado, os homens têm acesso ao Pai no Espírito Santo e tornam-se participantes da natureza divina. A Revelação, cuja plenitude está em Cristo, visa a salvação do homem e o sentido pleno da sua existência.
Ora, Jesus Cristo é o mediador e a plenitude de toda a revelação divina. Por intermédio d`Ele, Deus fala aos homens como amigos e convive com eles, para os convidar e admitir à comunhão com Ele. Importa destacar que a Revelação de Deus em Jesus Cristo, Verbo encarnado, acontece no tempo e na história. Tal Revelação atingiu a sua plenitude com a presença e manifestação de Jesus, com palavras e obras, sinais e milagres, e sobretudo com o Seu Mistério Pascal, e enfim, com o envio do Espírito Santo. Neste contexto, o tempo e a história são duas coordenadas a partir dos quais Deus se aproximou dos homens. Daí podemos afirmar que o Eterno entra no tempo, assumindo o rosto do homem e o seu contexto quotidiano. Convirá ainda sublinhar que a Revelação divina permite ao homem conhecer a verdade última da própria vida e do destino da história, e esclarece o seu mistério no mistério do Verbo encarnado.
O segundo ponto do primeiro capítulo da encíclica, chamado A razão perante o mistério, explana que, embora Jesus tenha revelado plenamente o rosto de Deus, o conhecimento que possuímos acerca d`Ele é sempre parcial e limitado. Neste sentido, a fé é a via que nos permite penetrar no mistério, proporcionando a compreensão coerente do mesmo sem nunca descurar a dimensão racional. Além do mais, o conhecimento da fé não anula o mistério, mas torna-o evidente e apresenta-o como um facto essencial para a vida do homem.
Pode-se, portanto, afirmar que a fé transcende o que é humano sem o desprezar. Por outro lado, a razão inscreve-se no âmbito das limitações humanas. É preciso ter presente que a fé não nasce da simples capacidade humana, visto que tudo aquilo que é humano é finito e ambivalente. Tendo consciência da finitude da razão humana, admite-se que perante o mistério da Revelação ela se sente incapaz de o conhecer por si próprio. Dito isto, verifica-se a transcendência da Revelação em relação à razão humana. Todavia, a fé não só não pode existir sem a dimensão racional, como sai diminuída, quando não se reconhece ou não se fomenta devidamente o lugar da razão na vivência crente.
Por último, cabe sublinhar que a razão é estimulada a superar os seus limites, mediante a abertura à fé. Isso significa que a primeira é convidada a aceitar a luz da Revelação para que possa funcionar com segurança e descubra a verdade revelada. Assim, a fé anima o esforço racional a ir mais longe, de forma a adentrar-se na realidade mais profunda, que a razão por si mesma não conseguia. O que fica dito não significa uma subjugação da razão à fé, mas é ver nela a luz que a orienta na sua busca da verdade. Na realidade, a fé não suprime a capacidade humana, mas precisa de uma razão autónoma aberta à Revelação de Deus Uno e Trino na história. No entanto, «a verdade que a Revelação nos dá a conhecer não é fruto maduro ou o ponto culminante dum pensamento elaborado pela razão…» [Cfr. JOÃO PAULO II, Fides et Ratio., nº 15] , mas sim do amor de Deus, que quis entrar na história da humanidade mediante a Revelação feita em Seu filho Jesus.

Edson